Não é raro que, a certa altura, o papo escorregue para o território do surpreendente e do inusual.
Aconteceu comigo. Resolvera dar uma trégua a compromissos urgentes que não levam a lugar nenhum, quando o estranho à minha direita declarou-se ensaísta.
- Venho me dedicando a um livro que não tem paralelo no mundo.
- Sobre?
- Sobre as monas.
Minha impressão foi de que ali se achava um zoólogo devotado ao estudo das consortes dos mais imediatos antepassados de todos nós: os macacos.
Ele logo esclareceu porém que era diverso o tema de sua obra. Investigava na verdade o temperamento, os usos e costumes dos mais pérfidos exemplares de mulheres que habitam a Terra.
Fez-se luz em minha memória. Monas eram, de acordo com a gíria vigente nos Anos Dourados, as garotas difíceis, aquelas que num dia te davam a maior bola e no seguinte te ignoravam.
Creio mesmo que me encantei por três ou quatro, mas ao perceber seu volúvel temperamento larguei-as de mão. Já nem recordava da existência da mutante, caprichosa classe.
Garantiu meu erudito vizinho, contudo, que nunca o gênero foi mais florescente. Com aplicada didática informou-me que seus métodos pouco variam.
Você é apresentado numa festa a uma ondulante engenheira. Ela lhe brinda com sua atenção, com olhares sedutores, não foge de tópicos íntimos. Mas quando você lhe telefona, ouve a voz de um iceberg.
Uma lindíssima gerente, que nunca pareceu notá-lo, convida-o para sua mesa no café, elogia sua conferência sobre polímeros, mas como a questão é um tanto árdua deriva para os desencontros das criaturas que trabalhando numa mesma empresa jamais travam um diálogo, comportam-se como absolutos desconhecidos, não desvendam seus sentimentos. Você nem espera 24 horas, dispara-lhe um e-mail. A resposta é capaz de constipar um pingüim.
A estonteante advogada que você encontrou no escritório de um colega - e que o sacana não lhe apresentou - surge gloriosa numa exposição de livros raros.
Você a cumprimenta cerimonioso, em breve estão comentando uma edição prínceps de O Corsário, e então trocam impressões acerca de arte, D. H. Lawrence, preconceitos tolos - e ela sublinha suas frases tocando-o no braço, no começo de leve, depois demorada e docemente.
Fica combinado um jantar no sábado, que você termina encarando tão desprovido de companhia quanto um ouriço.
- As monas - concluiu o futuro autor ao despedir-se - têm algo em comum: prometem e não cumprem, acendem esperanças que se orgulham de apagar, são falsas, inconstantes, fingidas e hipócritas.
Tenho pensado em seus sábios conceitos. Um país se constrói de homens e de idéias - mas também, concedo, da infinita dissimulação de deusas para sempre inatingíveis.
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